quarta-feira, 27 de agosto de 2014

FLORICULTURA PRIMAVERA





Em uma manhã de primavera Deborha, ocupava-se de suas rosas. Uma a uma eram igualmente acariciadas e cuidadosamente umedecidas.
Deborha, é uma mulher em seus 34 anos, cabelos loiros cacheados, pele clara, andar sereno, olhar de um azul profundo, extremamente observador, porém, dotado de uma doçura que a todos encantava.
Seu sorriso... Falar do sorriso de Deborha é ter a sensação de que a vida é simplesmente alegria e encantamento.



Talvez a alegria que Deborha detinha e que a todos envolvia, vinha exatamente de seu ambiente de trabalho. A tempos a floricultura “Primaveras”  tomava toda a atenção e os cuidados desta encantadora figura humana.
Mas Deborha, não é a única proprietária, ela tem uma sócia que se chama Patricia, linda morena, de poucos sorrisos e de humor instável, nunca se sabia de que maneira dever-se-ia aproximar dela, pois, ora era suave, ora ríspida e grosseira com funcionários e até mesmo com os clientes.
Deborha ao perceber esta instabilidade no humor de sua sócia, tomou para si as funções comercial e a de recursos humanos, deixando a Patrícia, o domínio sobre as áreas financeira e de compras da floricultura.
A relação que havia entre elas sempre foi muito equilibrada, independentemente do humor de Patricia, pois, a amizade que as unia foi construída ainda na infância das mesmas.



Naquela manhã Deborha percebeu o atraso de Patrícia, o que éra absolutamente incomum.
O normal sempre foi Patricia ser a primeira a chegar na floricultura, este atraso a preocupou, pois, percebia Patrícia mais silente nos últimos dias.
A manhã foi avançando nas horas, até que já passadas três horas Patricia chega, de óculos escuros, semblante fechado, passa por todos sem esboçar qualqur tipo de saudação.
Deborha apenas observa e continua seu trabalho, junto a duas senhoras indecisas, que se demoravam em escolher qual orquídea haveriam de comprar.
O dia prosseguiu, cada uma delas ocupada com os seus afazeres. No fechamento da floricultura, aproveitando-se de que estavam sozinhas, Deborha se aproxima de Patrícia e lhe diz:



- Querida que há com você hoje, chegou não falou com ninguém, manteve-se no escritório o dia inteiro, o que esta acontecendo com você?
Tentando disfarçar o desconforto da pergunta por Deborha dirigida a ela, Patrícia, esboça um tímido sorriso e responde-lhe em um tom de voz quase inaudível:
- Estou bem.
Deborha conhecendo a amiga desde os tempos de escola sabe que a resposta dada por Patrícia não condiz com a verdade.
Por esta razão sente-se bem a vontade para insistir em sua pergunta?
- Patrícia, eu a conheço desde o tempo em que engatinhávamos nossos primeiros passos, portanto, não adianta você tentar me enganar.
Patrícia se sente nu diante da amiga, pois o que  lhe foi dito é um fato do qual ela não pode negar, uma conhece a outra como se fossem irmãs. E sentindo-se a vontade diante desta amiga-irmã, Patrícia é tomada por lágrimas que vertem de seus olhos sem medidas ou constrangimentos.



Patrícia chora abraçada em Deborha por um longo tempo, até que aos poucos ela vai se acalmando, ante aos carinhos e os cuidados da amiga.
Cautelosamente Deborha, lhe pergunta mais uma vez:
- Pattrica, fale o que aconteceu, somente assim eu posso te ajudar?
Olhando aos olhos de Deborha, e já mais calma, Patrícia passa a descrever o que acontecerá com ela.
- Minha querida amiga, não sei mais o que fazer de minha vida, eu não posso perder o Paulo, ele disse-me que não me ama, que quer ir embora, como eu vou viver sem ele ao meu lado, como?



Em silêncio Deborha, continua a ouvir sua amiga.
- Temos dez anos de relacionamento, o que os meus amigos vão dizer de mim, o que a  minha família vai falar, eles vão certamente me culpar pela separação.
Eu já estou acostumada com ele, fizemos planos juntos, vivemos momentos tão belos e hoje não resta mais nada disto.
Paulo falta-me com o respeito, manda-me calar a boca até na frente dos amigos dele.
Censura-me em quase todas as minhas opiniões, até as roupas dele quem comprava ela eu, agora ele não quer mais que eu as compre.



Sinto-me uma inútil, parece que nada que faço tem valor, nada que eu faço esta certo.
Nem me procurar mais como mulher dele ele o faz, me diz que perdeu o desejo por mim, tenho dele apenas alguns momentos quando ele se embriaga e não tem noção do que esta fazendo, nestes momentos eu o tenho como meu marido, mas e depois, vem todo o desprezo, ele me diz que tem nojo de mim.
Mas eu o amo, entende Deborha, ele é o homem da minha vida, eu não sei viver sem o Paulo, o que vai ser de mim?



Continuando a descrever seu quadro, Patrícia segue falando sem dar oportunidade para ser interrompida por Deborha;
- Quando nos conhecemos ele era muito diferente, ele me mandava flores, dizia a toda hora que me amava, que queria ter filhos comigo, agora, ele diz que seria um pesadelo trer um filho comigo, seria uma tortura para a toda a vida.
A alguns dias quis fazer uma surpresa para ele, preparei um jantar para nós a luz de velas, quando ele chegou e olhou tudo o que eu preparei para nós, ele disse que tinha marcado um compromisso com os amigos, saiu e me deixou no chão chorando.
Entende Deborha, a minha vida é o Paulo, eu sem ele sou nada, não sei que rumo dar em minha vida, acho que eu morro sem o amor dele por mim.
O que você acha disto tudo que eu lhe falei, diz amiga, você vai me ajudar a reconquistar o Paulo?



De posse da doçura de sempre, Deborha se levanta apanha um copo com agua para Patrícia, e volta a sentar-se diante dela.
Lhe segura as mãos, olha-lhe nos olhos e suavemente começa a se fazer ouvir por Patrícia.
- Minha doce e querida amiga, há quanto tempo nos conhecemos?
Quantas coisas já vivemos juntas, quantas viagens, quanto mico já pagamos juntas, lembra?
Sempre fomos inseparáveis na escola, dividíamos as nossas tarefas, tínhamos praticamente duas mães e dois pais, isso sempre foi muito bom, você não acha?
- Sim. (responde Patrícia)
Deborha retoma a sua fala e argumenta a Patrica.
- Lembra-se dos nossos primeiros namorados, nós tínhamos medo de beijar na boca, acreditávamos que teríamos vergonha e que podia ser nojento, hahahahaha.
Neste momento as duas riem juntas, mas logo a seguir Deborha continua.
- Nossas experiências quase sempre foram compartilhadas, sempre fomos confidentes uma da outra, nossas brigas não duravam uma hora, pois, sempre arrumávamos uma desculpa para fazer as pazes.



Podemos até dizer que somos mais irmãs do que as nossas próprias irmãs de sangue podem ser de nós duas, e isso é uma verdade.
E quanto ao amor querida, por longo tempo ficamos sem namorados e quando uma conseguia um namorado, a outra imediatamente também o conseguia, parece que uma precisava do incentivo da outra para namorar, hahahah.
Novamente riram juntas.
- E o que falar do amor Patrícia, o amor quando nos toma, faz-nos voltar a ser crianças, não sentimos os pés no chão, parece que nada mais tem valor, e o que queremos é nunca sair dos braços de nosso amado. Tudo ganha cor, a vida se torna mais viva, mais alegre.



O amor é uma experiência maravilhosa, que enriquece a cada um de nós, nos ensina a crescer, nos ensina a somar, nos ensina a fortalecer as semelhanças, e é por elas que o amor cresce, somente por elas.
A esta altura Patrícia, já encontrava-se calam e atenta ao que sua amiga lhe dizia.
- Sabe Patrícia, aprendi que o amor é um estado de paz, respeito e compartilhamento de ideias, planos, vontades, desejos, escolhas.
É ao mesmo tempo em que um se permite estar no outro, o outro estará neste um, mas sem que o sentimento de posse possa ali se instalar, não que o apego possa ser a razão da proximidade e muito menos achar que o ciúme é uma forma de amor.



Não, o amor tem que ser leve, livre e respeitar ao outro e a si. O amor é como uma flor, igual as que temos em nossa floricultura.
Porque nossas clientes sempre falam que nossas flores são as mais belas da cidade? Elas dizem que nossas flores são lindas, porque são tratadas por nós com carinho, amor, zelo e concedemos atenção a elas, como se cada uma pudesse falar conosco.
Assim tem que ser o amor, ele tem que ser cuidado, tem que ser acolhido no coração e na alma. Ele tem que respirar ares de liberdade, falo da liberdade responsável, aquela que permite que a vida possa fluir por todas as vertentes da cumplicidade que o amor pode gerar. Quando se ama, não podemos amar com medo, com culpa, com condições. Estas aragens contaminam o amor e o enfraquecem até levarem-no a morte.



Não podemos igualmente nos prender ao passado para amar novamente, pois se assim o fizermos, não teremos paz em nosso presente, pois, sempre estaremos fazendo comparações com o que foi vivido, e o que se sucede com aquilo que vivemos agora. Um relacionamento sempe é diferente do outro, porque  o natural  é aprendermos cada vez mais a amar, e isto nos leva a uma qualidade melhor do amor.



Patrícia olha para Deborha como se nunca tivesse ouvido falar deste amor que lhe é descrito, mas segue apenas ouvindo a amiga, não ousa lhe interromper.
- Quando se ama Patrícia, temos que permitir sermos amados. Pode parecer contraditório o que eu te digo, mas creia, muitas vezes as pessoas querem apenas amar, outras vezes as pessoas querem apenas serem amadas, isto não é amor, podemos dar outros nomes a isto, mas não amor.



Um casal tem que ter respeito em sua relação, tem que ter atenção ao outro, ao que o outro faz, sente, pensa, deseja. Ao mesmo tempo um casal tem que saber que nem tudo que um deseja, sente, pensa ou faz tem que ser aprovado ou imposto ao outro. Uma relação também é feita de diferenças, mas estas diferenças têm que ser em pequena escala, ou seja, não podemos nos relacionar com alguém onde este alguém seja absolutamente o oposto do que sejamos, isto, nunca dará certo.



E não dará certo porque o tempo vai se encarregar em seu cotidiano de aumentar estas diferenças.  No inicio da relação podemos até nem percebe-lás, mas, com o passar do tempo elas passam a ser notadas, e com mais tempo a frente ainda, elas serão intransponíveis na harmonização da relação.
Por esta razão, as pessoas se separam com tanta facilidade, ou mantém uma relação doente por anos, sendo infelizes e desrespeitadas.



Patrícia aproveita um momento em que sua amiga faz uma pausa para uma respiração mais profunda e lhe pergunta:
- Então amiga, você acha que a minha relação tem cura?
Deborha faz-se silêncio antes de responder, mas logo retoma a sua oratória.
- Patrícia, você acha que a sua relação é prazerosa, lhe traz felicidade, lhe traz paz e há reciprocidade de sentimentos por parte do Paulo para você?
- Não. (Timidamente responde Patrícia)
- E você acha que o Paulo é feliz na relação de vocês?
- Também não. (Quase não deu para ouvi-lá)
- Então minha amiga, se nenhum de vocês dois é feliz, porque manter esta relação que já morreu?
Porque todo este seu sofrimento?



O que eu posso perceber daquilo que você me falou, é que você esta com medo de ficar sozinha, com medo do que as pessoas vão pensar de você. Parece-me que hoje, você esta querendo viver um amor que aconteceu lá no passado com o Paulo, mas que hoje já não existe mais.
Com este comportamento você não esta se respeitando como pessoa, se amando como pessoa, e nem permitindo ao Paulo e a você mesmo, a chance de serem felizes em novos caminhos que podem conceder as suas vidas.
Você tem que entender definitivamente, que o amor não aprisiona, o amor liberta, que o amor não é possuir, o amor é fluir, que o amor não é
paixão, o amor é apenas amor.


Deixe esta relação ir embora, deixe que vocês dois se curem dele, conceda-se liberdade, assim como ao Paulo igualmente seja ele livre.
Olhe para você minha querida, olhe para você com o valor que há em você.
Você não precisa ser feliz tendo que estar com alguém, você pode ser feliz estando com você mesma, porque o amor, ele não principia na união, ele principia em sua própria existência, a união com alguém apenas vai fazer com que o amor que há em você se eleve, e seja compartilhado com alguém que sinta o mesmo por si e por você.



Porque o nosso amor como amigas sempre foi consistente e forte?
Porque exatamente eu e você sempre nos permitimos ser livres e concedemos a outra liberdade, nós cultivamos este amor que se fortaleceu ano após ano, com respeito, cumplicidade, carinho, atenção e amor, muito amor que temos uma pela outra, assim como o amor que dispensamos as nossas flores.




Neste momento bem mais tranquila, Patrícia, ponderou ao longo daquilo que lhe era falado pela Deborha, e conseguiu ao final de sua conversa abrir um sorriso espontâneo e sem o peso de suas dores e de seus medos.
Mais tranquila Patrícia fala a Deborha:
- Sabe Deborha, a ouvi atentamente, e sei que você tem razão, quero ser feliz, assim como também desejo ao Paulo que ele seja feliz.



Por esta razão terei ao chegar em casa uma conversa com ele, e em acordo terminaremos a nossa relação em paz e com respeito.
Você me fez ver que eu estava errada, que eu perdi a ideia do que é amar, agora eu preciso recuperar isto em mim novamente.
Somente assim poderei um dia dizer verdadeiramente que amo alguém, pois consegui reconquistar o amor que eu tinha por mim, e poder dizer novamente que eu me amo.




Sorrindo Deborha abraça a sua amiga-irmã e lhe da um longo beijo em sua face, desejando-lhe paz e amor a cada instante de sua vida.
De mãos dadas as duas se retiram da floricultura  “Primaveras”, agora a floricultura esta mais perfumada e feliz do que jamais o fora.




Quando as rosas dos ventos soprarem em tua direção, atente para a flagrância dos amores que chegam a ti, apenas deixe-se envolver por esta atmosfera, se o amor é livre e verdadeiro. 


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